- “É UM GRUPO ARTICULADO QUE ARMOU ESSE ESQUEMA HÁ
ANOS, DESDE MINHA PASSAGEM PELA DIOCESE DE JANAÚBA, DE ONDE FUI TRANSFERIDO
PARA FORMOSA EM 2014”, CITOU O BISPO.
- Após deixar prisão, d. Ronaldo espera desfecho
do caso na residência episcopal; bispo e outras 6 pessoas respondem por desvio
de R$ 2 milhões
- O bispo permanecerá fora do cargo até a
definição de sua situação na Justiça.
Foto Igo Estrela/Estadão
Bispo Dom José Ronaldo,
acusado de desviar dinheiro de paróquias em Formosa (GO).
FORMOSA/GO
(por José Maria Mayrink/Estadão) – Foram 30 dias de prisão, a tristeza de não
celebrar a missa, a rotina sem noção de tempo, a mágoa de sofrer acusações para
ele injustas e, acima de tudo, humilhações que considera impensáveis, como as
duas vezes em que foi obrigado a ficar quase nu, só de cueca, para a revista
aos presos.
Acusado
de desvio de R$ 2 milhões de recursos das 33 paróquias da diocese de Formosa-GO,
d. José Ronaldo Ribeiro, de 61 anos, foi solto na terça-feira da semana
passada, 17 de abril, e reuniu parentes e colaboradores na capela improvisada
da residência episcopal, de 15 m², para agradecer a Deus estar de volta para
junto do rebanho – cerca de 400 mil pessoas, em 23 municípios. “Fomos
massacrados, acusados sem provas, com um método absurdo de condenar, prender e
apurar”, disse d. Ronaldo em entrevista ao Estado (jornal O Estado de São Paulo,
o Estadão), a primeira desde a prisão.
Ao
seu lado estava outro acusado, o padre Thiago Wenceslau, juiz eclesiástico com
doutorado na Pontifícia Universidade Lateranense, em Roma, que chegou a Formosa
em um domingo e foi preso na manhã seguinte, acusado de agir com o bispo. Padre
Thiago chorou o tempo todo na missa na capelinha particular. Fez cinco dias de
jejum, em sinal de protesto contra a prisão, e foi o último a ser libertado, 24
horas após a soltura de d. Ronaldo, um monsenhor, três padres e dois
empresários presos na Operação Caifás, sob acusação de falsidade ideológica e
desvio de dinheiro das paróquias.
Foto Oliveira Júnior
José Ronaldo Ribeiro,
segundo bispo da Diocese de Janaúba: “a armação começou quando ele levou para
Janaúba ex-dependentes de drogas de quem cuidava no trabalho pastoral”.
D.
Ronaldo saiu direto do presídio para a residência episcopal, em vez de se
hospedar na Casa do Clero, para padres doentes e idosos, conforme lhe
aconselharam. “Vim para cá, porque esta é minha morada. Eu ainda sou o bispo de
Formosa, embora afastado”, afirma.
Mas
quem decidirá onde ele deve ficar é o administrador apostólico, d. Paulo Mendes
Peixoto, arcebispo de Uberaba (MG), designado pelo Papa Francisco para dirigir
a diocese na ausência do titular. Ele deixou a Assembleia-Geral da Conferência
Nacional dos Bispos do Brasil, em Aparecida (SP), para passar o fim de semana
em Formosa. Viajou a conselho do núncio apostólico, d. Giovanni D’Aniello, para
confortar d. Ronaldo.
O
bispo de Formosa permanecerá fora do cargo até a definição de sua situação na
Justiça. Se for absolvido e o papa permitir, pretende retomar suas funções,
embora admita reavaliar a intenção. Depende da aceitação dos fiéis, até agora
aparentemente sem fissuras. Mesmo com as prisões, as missas de domingo
continuaram cheias. “É evidente que, se muitas pessoas me apoiam com sua
solidariedade, há também um pequeno grupo que pretende me afastar, por
discordar de meu estilo e de minha orientação pastoral”.
Ele
se refere aos padres que, na sua avaliação, armaram as denúncias para se livrar
dele. “É um grupo articulado que armou esse esquema há anos, desde minha
passagem pela Diocese de Janaúba-MG, de onde fui transferido para Formosa em
2014”. Segundo o bispo, a armação começou quando ele levou para Janaúba
ex-dependentes de drogas de quem cuidava no trabalho pastoral. Disse que, para
ajudá-los, sua conta ficou negativa.
Fazenda
e lotérica. Na acusação do Ministério Público de Goiás, d. Ronaldo é citado
como chefe de um grupo que teria desviado mais de R$ 2 milhões do dízimo
ofertado às paróquias, segundo denúncia assinada por 30 de seus diocesanos. O
dinheiro teria comprado uma fazenda de criação de gado e uma lotérica. “Sou
inocente, tenho certeza de que nada fiz de errado”, afirma. Segundo ele, quem
fez a compra foi padre Moacyr Santana, com recursos próprios, o que não
caracterizaria crime.
O
administrador apostólico, d. Paulo Peixoto, que está investigando as denúncias,
diz que, até o momento, parece não ter havido irregularidades. Os bispos do
Regional Centro-Oeste, que compreende as dioceses de Goiás e Distrito Federal,
viajarão a Formosa, nas próximas semanas, para levar conforto e solidariedade a
d. Ronaldo e aos demais acusados.
Como
a Justiça impôs medidas cautelares, d. Ronaldo está proibido de sair de Formosa
e foi obrigado a entregar o passaporte. "Disseram que eu pretendia fugir
do País porque preparava uma viagem a Roma para participar de uma reunião do
Movimento Neocatecumenal", diz. Acolhido ao sair da prisão pela mãe, dona
Nilda, de 90 anos, e por alguns de seus irmãos, ele tem tido a assistência de
parentes e amigos, que lhe fazem companhia e se oferecem para cozinhar.
Denúncia.
O promotor Douglas Chegury afirma que a investigação toma por base denúncia de
um grupo de 30 fiéis. "Mandaram informações por escrito, em um documento
assinado, apontando supostas irregularidades que haviam identificado".
Ele
destacou que as provas coletadas no processo, desde 2017, eram suficientes para
pedir a prisão preventiva. "Houve ocultação de provas e a intimidação de
testemunhas”. (Fonte: jornal O Estado de São Paulo, 23/04/2018)
Comentários