Assunto publicado na
edição de hoje, sábado, dia 2 de maio de 2015, no jornal Estado de Minas
Por Maria Clara Prates/Estado de Minas
A tática de engordar os
salários por meio de pagamentos de diárias para vereadores, prática comum nas
câmaras municipais de Minas, sofreu um duro golpe, desta vez em Jaíba, Norte de
Minas. O Ministério Público Estadual (MPE) apresentou denúncia criminal e cível
contra sete dos 13 políticos do município, em razão do pagamento indevido de
mais de R$ 500 mil. Análise dos documentos de prestação de contas revelou que,
num total de 353 dias úteis de janeiro de 2013 a maio de 2014, os vereadores da
cidade passaram 197 dias viajando, sendo que quase a metade foi para visitar o
gabinete do então deputado Luiz Henrique (PSDB), em Belo Horizonte.
Foto Oliveira Júnior
Câmara Municipal de
Jaíba, reunião dos vereadores no dia 4 de dezembro de 2013 ocasião em que o
então presidente Júnior Leonir se afastou da função para assumir a prefeitura
no lugar do prefeito e do vice-prefeito afastados em ação do Ministério
Público.
Mas Jaíba, município de
34 mil habitantes e baixo Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), não está
sozinho. Os cofres públicos da empobrecida Medina, no Vale do Jequitinhonha,
também sustentam vereadores com viagens frequentes à capital mineira e a
Brasília. Somente no ano passado, quatro vereadores gastaram R$ 72,4 mil com o
pagamento de diárias, o que significa 8% de toda a arrecadação do município. Em
Ipatinga, no Vale do Aço, os vereadores ousaram mais e, por meio de cursos de
formação em cidades praianas e paradisíacas do país, 14 dos 19 parlamentares
municipais gastaram R$ 460 mil em viagens, somente em 2014. Mas essas farras
com o dinheiro público também já são alvo de ações do MP.
Depois da análise de
vasta documentação, os promotores Paulo Márcio da Silva, Guilherme Roedel
Fernandez Silva e Glaucia Vasques Maldonado de Jesus concluíram que “apesar de
ter recebido pagamento a título de diárias de viagens, na verdade (os
vereadores) nunca realizaram qualquer deslocamento para fora do município nos
períodos indicados como de viagem”. Afirmaram ainda que o fato se agrava diante
da apresentação de declarações com conteúdo de falsidade ideológica, emitidas
por servidores de gabinetes de integrantes da Assembleia Legislativa de Minas
Gerais, para justificar fraudes contra o patrimônio público.
Segundo os promotores, a
concessão discriminada de diárias a seis vereadores denunciados foi uma
estratégia usada pelo então presidente da Câmara Municipal de Jaíba, Junior
Leonir (PSDB), reeleito para esta legislatura, para angariar “apoio político”,
em razão de disputa travada com o prefeito Jimmy Murça (PCdoB). Murça foi
cassado em 2013 pelos vereadores, mas retornou ao cargo em dezembro, por determinação
do Tribunal de Justiça de Minas.
DESVIO O prefeito chegou
a ser preso durante operação da Polícia Federal, em dezembro de 2013, em razão
de denúncias de Junior ao Ministério Público Estadual. Em março, o MP, com
apoio da Polícia Militar, fez nova investida na prefeitura para apurar o
envolvimento de servidores municipais com o desvio de R$ 15 milhões,
especialmente na área de saúde. A operação foi apelidada de Ração de Papagaio,
expressão usada pelos funcionários para pedir propinas.
Conforme pedido dos
promotores nas ações cível e criminal em Jaíba, as penalidades para os
denunciados podem ser duras. Na ação penal, eles vão responder pelo crime de
peculato e estão sujeitos a uma pena de R$ 500 mil. Além disso, podem perder
bens, o cargo e ter decretada pela Justiça a perda de direitos políticos. Na
cível, na qual respondem por improbidade administrativa, com pedido de liminar,
os vereadores podem ser afastados, de imediato, da função, ter os bens
indisponíveis até o valor total de R$ 517,4 mil que foi desviado, além da
quebra do sigilo fiscal.
Peregrinação na mira do
MP
A análise das informações
sobre as viagens e suas justificativas levou o Ministério Público a colecionar
alguns exemplos de desperdício do dinheiro público. Segundo a denúncia, em junho
de 2013, os parlamentares realizaram 14 viagens a Belo Horizonte, todas tendo
como destino o gabinete do então deputado Luiz Henrique, sendo que três deles
num único dia, segundo atestados assinados pela então servidora do parlamentar
Daniela Abreu e Silva.
“Afinal de contas, o que
tanto foram fazer os nobres vereadores no gabinete do deputado, enquanto há
incontáveis e inadiáveis problemas a serem resolvidos na sede do município da
Jaíba, o qual parece entregue à própria sorte, consumido por distintas organizações
criminosas que avançam impiedosamente contra o interesse público e o patrimônio
municipal?”, criticou o MP.
O questionamento dos
promotores se estendeu também à veracidade dos atestados e das atas de sessões
ordinárias e extraordinárias da Câmara Municipal de Jaíba. De acordo com eles,
os vereadores Junior Leonir, Valdemir Soares da Silva, Elias Silva, Noelson,
Fernando Fernandes, Welton Silva, José Geraldo e Luciano de Souza apresentaram
declarações de presença no gabinete de Luiz Henrique, apesar de assinarem a ata
de presença em sessão da Câmara e até mesmo pediram a palavra na tribuna. O MP
fez questão de frisar que as sessões do Legislativo de Jaíba se resumem a duas
por mês.
LIGEIRINHO Outro caso que
chamou a atenção, de acordo com as ações, é a do vereador Valdemir, que, em 7 e
8 de maio de 2013, estaria em viagem a Montes Claros, “para tratar de assunto
de interesse do município”, e, para tanto recebeu R$ 300. No entanto, no mesmo
relatório ele declarou que no dia 7 esteve também no gabinete do deputado
tucano e, novamente, fez jus a outros R$ 500 de diária. A distância entre Belo
Horizonte e Montes Claros é de 417 quilômetros, que teria sido percorrida com
ida e volta no mesmo dia, além da duplicidade no pagamento da diária.
O Estado de Minas tentou
contato com os vereadores denunciados, mas não obteve retorno. O ex-deputado
Luiz Henrique, que estava em viagem, não retornou o pedido de entrevista
deixado em seu celular. A servidora da Assembleia Legislativa de Minas Daniela
Abreu e Silva não foi encontrada. De acordo com a assessoria de imprensa,
Daniela presta serviço no interior do estado, onde não foi localizada. (Fonte:
jornal Estado de Minas, dia 2 de maio de 2015, no link http://www.em.com.br/app/noticia/politica/2015/05/02/interna_politica,643231/cerco-a-diarias-de-viagens.shtml)
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